C. BAUDELAIRE
Epílogo para a 2ª edição de As flores do Mal
II
Tranquilo como um sábio e suave como um maldito,...
eu disse:
Eu te amo, oh! minha muito bela, oh! minha encantadora...
Quantas vezes...
Tuas devassidões sem sede e teus amores sem alma,
Teu gosto do infinito
Que em todos os lugares, no próprio mal, se proclama,
Tuas bombas, teus punhais, tuas vitórias, tuas festas,
Teus arrabaldes melancólicos,
Tuas casas de cómodos,
Teus jardins cheios de suspiros e de intrigas,
Teus templos vomitando a prece musicada,
Teus desesperos de criança, teus brinquedos de velha louca,
Teus desânimos;
E teus fogos de artifícios, erupções de alegria,
Que fazem o céu rir, mudo e tenebroso,
Teu vício venerável exposto sobre a seda,
E tua risível virtude, com olhar infeliz.
Doce, se extasiando diante do luxo por ele desdobrado...
Teus princípios salvos e tuas leis conspurcadas,
Teus monumentos altivos onde as brumas se agarram,
Tuas cúpulas de metal que o sol incendeia,
Tuas rainhas de teatro com vozes sedutoras,
Teus sinos que tocam o alarme, teus canhões, orquestra ensurdecedora,
Teus calçamentos mágicos que se erguem qual fortalezas,
Teus oradorezinhos, com empolações barrocas,
Pregando o amor, e depois, teus esgotos cheios de sangue,
Se engolfando no Inferno como Orenocos,
Teus anjos, teus bufões novos com velhos andrajos,
Anjos vestidos de ouro, de púrpura e de jacinto,
Oh! vós, sede testemunha de que cumpri meu dever
Como um químico perfeito e como uma alma santa.
Pois de cada coisa extraí a quintessência,
Tu me deste tua lama e eu a transformei em ouro